Uma realidade desafiadora

*por Raul Henry

Como dizia Tom Jobim, o Brasil não é para principiantes.

Como conceber que uma nação de território continental, com imensas riquezas naturais, sem relações conflituosas com a vizinhança, com uma população miscigenada, sem guerras étnicas, culturais ou religiosas e com uma enorme diversidade cultural, não tenha se transformado na grande civilização dos trópicos preconizada por Darcy Ribeiro?

Por que, depois de 81 anos de escrito, o título do livro de Stefan Zweig, “Brasil, O País do Futuro”, não se tornou realidade?

Por que, com tantas vantagens comparativas, o Brasil não trilhou o mesmo caminho de outras nações – como Portugal, Espanha, Irlanda, Coreia, Taiwan, Austrália e Nova Zelândia, entre outras – que nos últimos 50 anos superaram a armadilha da renda média e salvaram da pobreza as camadas mais vulneráveis das suas populações?

Por que, ao longo do tempo, o país não conseguiu adotar uma agenda racional, inspirada na experiência das democracias mais avançadas do mundo?

O desafio contemporâneo do Brasil é mais que evidente: crescimento econômico com inclusão social e redução das desigualdades. E para cumprir esse objetivo há uma agenda clara, que está em todas as mesas de debates do país. Em síntese, ela pode ser apresentada em 10 pontos.

1. Promover uma educação pública de qualidade para todos.

2. Aumentar o investimento público e induzir o aumento do investimento privado em ciência, desenvolvimento tecnológico e inovação.

3. Conceber uma rede de proteção social que ofereça oportunidades para a saída da pobreza.

4. Realizar uma reforma do Estado para reduzir seu custo, aumentar sua eficiência, combater privilégios, implantar o conceito de mérito no serviço público e aumentar sua capacidade de investimento.

5. Aumentar o investimento público em infraestrutura, sobretudo em setores pouco atrativos à iniciativa privada, como saneamento básico e mobilidade urbana.

6. Realizar uma reforma tributária que simplifique o sistema – o mais complicado do mundo –, unifique os impostos sobre consumo e institua um imposto de renda progressivo, cobrado em função do nível da renda e não do regime jurídico do contribuinte.

7. Implantar políticas efetivas de proteção ao meio ambiente, com uma ênfase especial à Amazônia.

8. Fortalecer o sistema público de saúde.

9. Corrigir os desequilíbrios regionais, com atenção especial à Região Nordeste, cuja renda per capita é apenas metade da média nacional.

10. Executar reformas institucionais e microeconômicas que promovam segurança jurídica e fluidez ao ambiente de negócios, tornando-o mais atrativo ao investimento internacional, já que a poupança interna tem níveis historicamente baixos.

Com algum grau de liberdade, essa agenda pode ser considerada razoavelmente consensual. Há ainda outro item, menos pacífico, mas absolutamente necessário, que é uma reforma política para tornar o sistema eleitoral mais funcional e extinguir a reeleição para cargos executivos, experiência que, comprovadamente, deu errado no país. Por que, então, esse programa não avança?

Segundo o economista Albert Hirschman, o desenvolvimento de uma sociedade depende de uma única variável: a capacidade que tem essa sociedade de tomar decisões certas. Por que no Brasil isso não aconteceu?

Em um breve balanço dos últimos 40 anos, com exceção da permanência das instituições democráticas, não há muito o que comemorar. O país cresceu a taxas medíocres, menores que as médias mundiais, e mesmo com um aumento substancial da carga tributária (de 23% para 35%), a capacidade de investimento do Estado é, praticamente, nula. E o pior, o Brasil continua em destaque entre as nações mais desiguais e excludentes do planeta.

Responder a todas as questões suscitadas acima não é tarefa fácil. Certamente as causas desse fracasso têm raízes profundas. Estão no próprio processo de formação da sociedade brasileira.

As marcas deixadas por uma colonização extrativista e escravocrata, temperada pela mentalidade patrimonialista da ancestralidade ibérica, são difíceis de apagar. Os principais legados dessa história são exclusão, naturalização da desigualdade e total falta de compromisso com um verdadeiro projeto de nação. O Estado é compreendido exclusivamente como fonte de captura de renda e obtenção de privilégios pelos que possuem o seu controle, como registrou magistralmente Raymundo Faoro no clássico “Os Donos do Poder”.

Essa mentalidade da elite brasileira se perpetuou e se manifesta em todos os setores da vida nacional. Está presente no corporativismo insaciável dos que estão no topo do serviço público, nas relações promíscuas e incestuosas do capitalismo de compadrio, na corrupção endêmica existente no país e no pacto de autoproteção protagonizado por esses “donos do poder”.

O ex-senador Cristovam Buarque, no seu honesto e reflexivo texto “Por Que Falhamos”, faz uma autocrítica dolorosa sobre o período de 1992 a 2018, em que forças democráticas e consideradas progressistas governaram o país: “fracassamos ideológica, política, econômica e moralmente”.

Na mesma linha, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cunhou outra frase para traduzir a competição entre PT e PSDB, as duas principais forças políticas do período pós-ditadura:

“Disputamos para ver quem comanda o atraso”.

De fato, há um inegável fracasso da geração que combateu a ditadura militar e que sonhou com uma nação democrática, republicana, desenvolvida e justa. E esse fracasso teve origem na capitulação diante das velhas práticas do que existe de mais atrasado, atávico e anacrônico na sociedade brasileira. O resultado da eleição de 2018, e o retrocesso político, institucional e civilizatório que ele representa, é a expressão mais evidente do nosso estrondoso desastre. Para agravar o cenário, o nível de divisão e radicalização política na sociedade brasileira só piorou de 2018 para os nossos dias.

Mas a pergunta mais difícil de responder, entre todas as provocações já feitas nesse texto, é: como podemos sair dessa encruzilhada e seguir adiante? A provável resposta está nos ensinamentos que nos dão os momentos críticos da história das nações.

Uma possibilidade é um amplo movimento social, como ensaiado nas jornadas de junho de 2013, que possa promover avanços institucionais e despertar uma nova consciência e atitude na elite política e socioeconômica brasileira, já que é a ela que cabe o papel natural de conduzir os rumos do país.

A outra é o surgimento de um líder com compromisso e dimensão de estadista, e com capacidade de inspirar vastos setores da sociedade brasileira, desarmar espíritos, apontar para o futuro e realizar as transformações há muito reclamadas pelo país.

Mas para que isso aconteça é imprescindível, em primeiro lugar, derrotar a ameaça fascista nas próximas eleições. Depois, rechaçar eventuais aventuras golpistas e preservar as instituições democráticas. Por fim, cada um fazer a sua parte, procurar ficar do lado certo da história e, acima de tudo, não perder a esperança no Brasil.

*Raul Henry é deputado federal pelo MDB Pernambuco

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